‘Só Bolsonaro e igrejas têm condição de fundar partido’, diz advogado que criou sete legendas

TSE exige cerca de 490 mil assinaturas de eleitores em todo o país para criar nova legenda

A sugestão do presidente Jair Bolsonaro de que poderia criar um partido do zero, numa alternativa ao racha com o PSL, é considerada plausível pelo advogado Marcílio Lima Duarte, que participou da criação de sete legendas no Brasil. Marcílio, que considera “bastante rigoroso” o processo de fundar uma nova sigla, vê o clã Bolsonaro em condições de articular a estrutura nacional para dar corpo a um projeto do tipo. Embora o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tenha 76 partidos já em processo formação, o advogado avalia que Bolsonaro conseguiria “furar a fila” caso investisse na criação de uma legenda.

Para criar um partido, o TSE exige cerca de 490 mil assinaturas de eleitores em todo o país. A legenda também precisa obter, em nove estados, o equivalente a pelo menos 0,1% dos votos de cada um deles para a Câmara dos Deputados na eleição de 2018. Dos 76 partidos em formação, apenas quatro se encontram atualmente na etapa final, que é dar entrada no pedido de registro no tribunal.

— A obtenção de assinaturas é muito difícil, por conta das exigências da lei. É feito para dificultar a criação de novos partidos. Hoje vejo poucos grupos com essa condição. O pessoal do Bolsonaro tem condições de fazer. Depois dele, só as igrejas — afirmou Marcílio.

Durante a viagem oficial ao Oriente Médio, Bolsonaro declarou que “não teria dificuldade” em fundar um novo partido e sugeriu o nome “Partido da Defesa Nacional”. Não existe, oficialmente, uma iniciativa para fundar esta legenda no TSE. O início do processo depende de uma ata de fundação assinada por um mínimo de 101 eleitores e pela publicação do programa e do estatuto da legenda em Diário Oficial. A partir do registro em cartório, a legislação prevê um prazo de dois anos para a coleta de assinaturas e validação pelo TSE.

Dificuldades mapeadas

Marcílio atuou na formação do próprio PSL, na década de 1990, e de legendas como o Prona, do ex-deputado Enéas Carneiro, e PTN, que abrigou a candidatura do ex-presidente Fernando Collor. O último partido fundado com a atuação do advogado foi o Solidariedade (SD), do deputado federal Paulinho da Força, dirigente da Força Sindical. Atualmente, o advogado diz atuar na criação de outras três legendas, mas não revela quais.

Finalizado em setembro de 2013, o processo de criação do Solidariedade durou oito meses, prazo considerado atípico por Marcílio. A musculatura da Força Sindical e a rotina de viagens montada pelo próprio Paulinho por todo o país garantiram pouco mais de 1 milhão de assinaturas. Destas, cerca de 500 mil foram validadas pelo TSE.

— Bolsonaro conseguiria convocar 2 ou 3 milhões de apoiadores para um novo partido. Algumas denominações evangélicas, também. Mas é claro que precisaria de uma estrutura gigante de coleta, validação em cartório. Lembro que o (Gilberto) Kassab teve dificuldades para conseguir criar o PSD, mesmo sendo prefeito de São Paulo à época — observou Marcílio.

O ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Admar Gonzaga, que tem assessorado Bolsonaro na tentativa de encontrar uma saída do PSL sem risco de perda do fundo partidário, atuou com Kassab na criação do PSD, em 2011. O processo teve denúncias de falsificação de assinaturas, mas o partido obteve o registro a tempo das eleições de 2014.

O TSE exige o número do título eleitoral de todos os apoiadores da criação do partido. A conferência das milhares de assinaturas é feita por cartórios eleitorais a partir da comparação visual com os livros de votação, o que pode levar à anulação de diversos apoiamentos. A Rede Sustentabilidade, da ex-senadora Marina Silva, não conseguiu o registro a tempo das eleições de 2014, porque teve cerca de 160 mil assinaturas invalidadas pelo TSE. Em 2015, mudanças na legislação reduziram o prazo para um partido validar as assinaturas e instituíram um sistema eletrônico para que as próprias legendas fizessem a digitalização de cada uma das fichas de apoio — mesmo assim, os papéis devem ser entregues presencialmente nos cartórios. Na época de fundação do Solidariedade, Marcílio lembra que alguns livros de assinaturas foram transportados com escolta de segurança.

Quatro pedidos no TSE

Um dos quatro pedidos de registro que tramitam atualmente no TSE é o da Unidade Popular (UP), partido que defende bandeiras histórias da esquerda, como a reforma agrária e a reestatização de empresas em setores estratégicos. O processo de coleta de assinaturas começou em setembro de 2016. Na última semana, o partido recebeu dois votos favoráveis da Corte eleitoral, que conta com sete ministros, e alimenta esperanças de obter o registro a tempo das eleições municipais do próximo ano. O julgamento foi interrompido porque o ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto pediu vista.

— Diziam que era impossível conseguir o registro nessa nova lei. Buscamos assinaturas nas periferias, em escolas, metrô e porta de fábrica. Foi um trabalho hercúleo, inclusive dos funcionários de cartórios eleitorais, que nos trataram muito bem — afirmou Leonardo Péricles, presidente da Unidade Popular.

O Partido da Evolução Democrática (PED) aguarda seu pedido de registro entrar na pauta da Corte. Um dos apoiadores do partido foi o presidente Jair Bolsonaro, quando ocupava uma cadeira na Câmara dos Deputados. A assinatura de Bolsonaro, no entanto, não foi contabilizada, por se tratar de um filiado a outro partido político — condição vedada pela legislação. Gilson Lima, presidente do PED, participou também da fundação do PROS em 2011.

— A diferença entre os dois processos é que as mudanças na lei trouxeram mais transparência e legitimidade à coleta de assinaturas. Por enquanto, não penso em nomes que possam se candidatar. Só penso em finalizar o registro do partido – disse Gilson.

Fonte: Agora Noticias Brasil

 

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